#8 OUVIR NO MEIO DO RUÍDO
Com o mercado a explodir com novos conceitos e empresas, quem conseguir distinguir-se pela consistência e pela honestidade da sua história ganhará a confiança do consumidor. Os produtores agrícolas já não têm como não entrar no mundo online.
Confessem: o ruído digital dos meses de recolhimento e confinamento começou a incomodar. Sem outra forma de chegar ao consumidor, o mundo online tornou-se no palco por excelência para comunicar e vender produtos. Nasceram fórmulas inovadoras de venda, multiplicaram-se as empresas que vendem cabazes de fruta, legumes, carne e peixe ao domicílio, os influencers foram inundados de produto oferecido pelas marcas, os artistas animaram as nossas noites com concertos em direto, ouvimos fórmulas repetidas em vídeos inspiradores com mensagens de força, de união, uma nova forma de dizer “estamos juntos” e “vai correr tudo bem”.
Mas o regresso à normalidade, comandada pelo ritmo de propagação do coronavírus, faz-nos querer descansar deste ruído e recuperar o essencial. O aumento de mais de 500% das pesquisas sobre compras online (de acordo com o estudo “Oráculo Wpp, Novo Normal”) e o crescimento efetivo desta forma de consumo dá-nos pistas para o que aí vem. Todos concordam que seremos cada vez mais um mercado digital, vamos preferir reduzir as idas às lojas e daremos ênfase ao consumo em casa, como bem lembra a Centromarca, Associação das Empresas de Marca. Outro ponto fundamental que a associação tem sublinhado: vamos privilegiar os operadores que, ao produto e ao preço, aliem um bom serviço.
A sobrevivência das múltiplas novas ofertas e negócios será testada nos próximos tempos. São muitos os produtores locais que abandonaram a exclusividade dos canais de distribuição tradicionais e a resposta dos consumidores é nada menos do que incrível. Há uma avidez pela compra direta, motivada por uma maior consciência sobre o produto, a sua origem e o impacto que essa escolha tem na vida do outro (agora com rosto próprio e uma história para contar). Há um bem superior ao da mera necessidade de comprar pão ou fruta: há a ideia de que ao comprar ao produtor estamos a ajudar alguém.
Mas esta multiplicação de oferta e excesso de informação também contribuiu para o ruído. A desfragmentação começa a ser generalizada e será menos competitiva a médio prazo face aos imensos desafios logísticos e à exigência de resposta “ao segundo” que hoje se espera no e-commerce.
Quando tudo acalmar, vamos querer recuperar o essencial e ouvir a verdade no meio do ruído. E quem conseguir distinguir-se pela consistência e pela honestidade da sua história ganhará a confiança do consumidor.
Os produtores agrícolas têm as portas abertas para, finalmente, entrar no mundo online e é preciso que o façam de forma coerente com a sua visão e missão do negócio, investindo no serviço ao cliente. Têm de estar nas redes sociais. Mas devem fazê-lo da maneira correta, com conceitos que transmitam essa verdade essencial da produção, o respeito pela natureza e a responsabilidade que têm nas mãos enquanto provedores de alimento.
Ana Rute Silva
anarute@agenciaevaristo.pt
Artigo publicado na edição de junho da Revista Frutas Legumes e Flores
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