#23 EMPRESAS COM PROPÓSITO: O QUE PODEMOS APRENDER COM ELAS
Talvez seja preciso refletir melhor sobre o propósito com que, diariamente, se gerem empresas. E que futuro queremos deixar para a próxima gerações.
Adrián Caldart, professor da AESE Business School, trouxe-nos, no final de janeiro, algumas pistas sobre o que podemos esperar de 2022. Ouvimo-lo durante a conferência “Internacionalização da Portugal Fresh 2022 e 2023”, que decorreu na escola de negócios, em Lisboa, perante uma sala bem composta de produtores, especialistas e parceiros institucionais. Entre as várias tendências que partilhou, gostava de destacar aqui a das Empresas com Propósito.
Escrevo com letra maiúscula para sublinhar a importância do assunto que, diga-se, não é novo, mas tarda em disseminar-se. O setor alimentar tem, mais do que qualquer outro, uma missão primordial para o planeta e para a humanidade. Sem ele, não há alimento. Mas o que Adrián Caldart sublinha com esta tendência é que, hoje, é preciso ir mais além nesta missão.
Bem sei que a questão ambiental preocupa o setor e a sua viabilidade económica. Mas talvez seja preciso refletir melhor sobre o propósito com que, diariamente, se gerem empresas. E que futuro queremos deixar para a próxima gerações.
Partilho um exemplo que foi descrito durante a interessantíssima sessão na AESE: o da Ametller Origen, fundada em 1830 por uma família de oito gerações de agricultores da Catalunha. Foi preciso chegar a 2001 para que os irmãos Josep e Jordi Ametller decidissem estreitar o caminho até ao consumidor e abrir uma loja para venderem os seus produtos locais, sustentáveis e de elevada qualidade. A recetividade foi tal que, de três hectares em exploração, a empresa aumentou para 1500. Em 2020 faturou 310 milhões de euros. A Casa Amettler é hoje uma referência no retalho espanhol, com 100 lojas na Catalunha. A par disso, o grupo produz também refeições prontas a comer e abastece restaurantes e hotéis. Mas vamos ao que interessa.
A estratégia de crescimento nunca deixou de lado a missão de produzir produtos sustentáveis e, com o recente projeto de criar o Agroparc Penedès – um cluster agroalimentar com um investimento de 180 milhões de euros – a Ametller Origen pretende ser a primeira empresa agrícola a deter um parque agroindustrial sem emissões de CO2, “a primeira cidade “agrosuficiente da Europa”. Trata-se de construir “um novo modelo agroalimentar e “produzir alimentos de forma mais sustentável e circular”, disse ao El País Josep Ametller, conselheiro delegado e cofundador do Ametller Origen. Para lá chegar, será preciso reformular o modelo alimentar atual e usar tecnologia para evitar emissões. A promessa é, com o projeto, evitar a emissão de 1400 toneladas de CO2 por ano.
Oferecer produto sustentável mesmo com crescimentos explosivos do negócio é o desafio da empresa que incorporou o seu propósito na estratégia. Não escapa, contudo, aos protestos dos ambientalistas. Um projeto disruptivo terá sempre vozes discordantes. Mas o propósito está lá e tem um plano visível em andamento.
Há, claro outros exemplos. Em Portugal, e à sua escala, a Gwiker desenhou também um modelo de negócio com a missão de oferecer “earth food”, produzindo de forma natural, saudável e sustentável. Usa frutas e legumes rejeitados pela grande distribuição para produzir novos produtos, 100% naturais e sem adição de açúcares e conservantes, recorrendo a energia solar. Ou a Veracruz que, com amendoais modernos, está a implementar um sistema de blockchain que permitirá medir todos os impactos da sua produção e ter, na palma da mão, o percurso da amêndoa, desde a árvore ao prato.
Como sempre, a comunicação colocará no mapa as empresas com propósito. Todos queremos saber como se produzem os alimentos que consumimos. E tenderemos a optar pelos que nos contam a sua história e seguem critérios de produção naturais e amigos do ambiente. É, aliás, outra das tendências para 2022 destacadas por Adrián Caldart e veio para ficar.
Ana Rute Silva
Partner da Evaristo
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